quinta-feira, setembro 28, 2023
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Por que estou gostando taaaaanto da série “Ted Lasso”?

Ted Lasso é uma série original da Apple TV+ protagonizada, roteirizada e produzida por Jason Sudeikis.

A história se desenrola na Inglaterra, no fictício time da Premier League AFC Richmond. Apesar de Ted Lasso ser treinador de futebol americano (football), a presidente do time Rebecca Welton (Hannah Waddingham) resolve contratá-lo para treinar seu time de futebol (soccer). Ted Lasso aceita o desafio mesmo sem ter experiência ou sequer saber as regras do esporte. O que ele não sabia é que sua contratação era um plano de Rebecca para arruinar o time que, outrora, foi presidido por seu ex-marido. Destruir o AFC Richmond era a vingança que Rebecca planejou após anos de traição e humilhação.

Eu estou amaaaaaando a série! Fazia tempo que nós aqui da TaBEERna Geek não nos interessávamos tanto em uma série de comédia. Desde The Office e Parks and Recreations, para ser mais exata. Listarei abaixo todos os motivos que me cativaram tanto e colocaram esta série entre as minhas preferidas. ATENÇÃO: este texto contém alguns spoilers.

Um time de futebol masculino é presidido por uma mulher

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Você merece tudo que quiser.

Rebecca Welton ficou com a presidência do AFC Richmond na divisão de bens durante o divórcio mas isso não a torna inferior na gestão do time: TODOS os funcionários e atletas RESPEITAM a autoridade dela. O único exemplo de machismo escroto terminou logo no primeiro episódio quando a chefona poderosa demitiu sumariamente o treinador do time que, além de incompetente, era misógino.

Aqui tem sororidade!

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Bem diferente do que se prega por aí, a tal competição feminina não existe nessa série. As personagens femininas mais importantes se apoiam, se incentivam, se consolam e torcem pelo melhor umas pelas outras. É lindo de se ver!

Homens também podem ser vulneráveis. E tá tudo bem!

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Sou todo ouvidos.

Uma cena que achei interessantíssima foi a que Keeley (Juno Temple) se masturbava sozinha no quarto enquanto assistia a um vídeo emocionado de seu namorado anunciando sua despedida do futebol. No vídeo, Roy Kent (Brett Goldstein) dá adeus às chuteiras e chora muito relembrando sua trajetória diante dos jornalistas. Essa cena não tem nada de excitante a princípio, mas quando Keeley é flagrada por Roy, ela explica que demonstração de vulnerabilidade lhe dá tesão.

Os meninos estão acostumados a ouvir “Homem não chora” desde cedo e são desencorajados a expressarem seus sentimentos, medos e angústias, afinal, um Homem pode ser vulnerável. No entanto, os números mostram o quanto essa ideia machista é péssima também para homens: homens apresentaram um risco 3,8 vezes maior de morte por suicídio que mulheres. “Entre homens, a taxa de mortalidade por suicídio em 2019 foi de 10,7 por 100 mil, enquanto entre mulheres esse valor foi de 2,9” segundo o Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde publicado em setembro de 2021. Além disso, homens abusam de substâncias entorpecentes e álcool 2,5 vezes mais que mulheres como válvula de escape, segundo pesquisa da Universidade de Oxford.

Homens também choram, também sofrem, também sentem saudades de alguém, também precisam de colo… mas enquanto o machismo ensinar que homens devem parecer inabaláveis o tempo todo e sufocar seus sentimentos, os números que apresentei acima vão aumentar. A série mostrou com muita delicadeza como o homem pode demonstrar sua vulnerabilidade sem deixar de ser homem

Ah, se eu fosse homem de parar de me portar
Feito um rochedo
Indestrutível, infalível, inabalável, imutável
Previsível, impossível, um computador com músculos
Um chefe, um pai, um homem com H maiúsculo
Eu seria o homem certo pra você
Ah, se eu fosse homem

Saiba desistir

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Saia da lixeira!

O pai de Ted Lasso cometeu suicídio quando o protagonista era ainda adolescente. Esse acontecimento chocante marcou muito a vida do personagem. Ted Lasso entendeu que o pai desistiu da vida e de tudo que ela tinha, por isso, assimilou que jamais poderia desistir de qualquer coisa.

Nesse mundo de coaches que dizem que absolutamente tudo é possível, saber desistir é uma grande demonstração de sabedoria. Não tô dizendo que é pra abandonar o barco na primeira dificuldade mas para ter discernimento de quando é o melhor momento de cair fora. Pode ser aquele projeto que não tá engrenando, aquele emprego detestável, aquela amizade que só te atrasa ou até um casamento de mais de uma década com um filho envolvido.

Por achar que nunca poderia desistir, Ted Lasso insistiu num casamento falido, impedindo que ele e a (ex)esposa tivessem a chance de serem felizes separados. A mãe de Rebecca se sujeitou a ser traída e humilhada durante todo seu casamento até a morte do marido; Roy Kent suportou as fortíssimas dores da idade enquanto insistia na carreira de jogador; esses são mais dois exemplos de como desistir também pode ser uma boa idéia.

Não basta fazer filho. Tem que ser PAI!

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Vários personagens da trama são assombrados por traumas de infância que envolviam seus pais, incluindo o próprio Ted Lasso.

Nathan (Nick Mohammed) sofreu com um pai indiferente, distante e extremamente crítico. A consequência disso foi a baixíssima autoestima do personagem na fase adulta que evoluiu para um comportamento desrespeitoso e agressivo durante a segunda temporada da série. De personagem fofo a vilão, o ápice da maldade de Nathan culminou no último episódio da segunda temporada. Acredito que os conflitos internos de Nathan terão bastante visibilidade na terceira temporada.

Jamie (Phil Dunster) herdou o comportamento babaca de seu pai. Ele repetia as características do pai como forma de obter sua atenção e aprovação. Jamie obteve sua redenção e o perdão de seus companheiros de time à medida que descobria que repetir esses comportamentos era nocivo a si mesmo. Ele conseguiu reconhecer a toxicidade de seu pai, reconhecer a repetição em si e se afastar disso.

Rebecca (Hannah Waddingham) odiava o próprio pai a ponto de não desejar ir ao seu enterro porque o flagrou traindo sua mãe. O cinismo do pai após o acontecido fez com que Rebecca se afastasse definitivamente dele, mas com a ajuda da mãe e das amigas ela conseguiu o perdoar e seguir adiante em paz.

Roy Kent (Brett Goldstein) é a figura paterna de sua sobrinha porque o pai dela a abandonou com a mãe.

A presença desastrosa ou a ausência completa de um pai prejudica aos montes a vida de uma criança e aumenta as chances de futuros transtornos psicológicos. Segundo a psicóloga Carolina Caetano, adultos que sofreram com a ausência física e/ou emocional de um pai podem desenvolver sentimentos de culpa (crescem sentindo que algo está errado consigo), baixa autoestima (visão pouco valorosa de si mesmo), isolamento emocional (não se permitem sentir dor, não dividem os seus sentimentos de amor e de afeto, se fecham emocionalmente até para si mesmos), vícios e outras formas de fuga (usar álcool, drogas, sexo e/ou trabalho para fugir da dor do seu passado), depressão ou ataque de raiva (descontar suas frustrações em outras pessoas).

Reparando bem, todas as consequências citadas se parecem muito com os problemas pelos quais os personagens de Ted Lasso passam, não? As lacunas da paternidade ruim são dolorosas e difíceis de curar.

Então…

Cuidar dos seus problemas psicológicos não é frescura

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A verdade vai te libertar, mas antes, vai te deixar muito put*

Lá em cima, quando escrevi que tá tudo bem homens exporem suas vulnerabilidades, fiz a deixa do que penso ser o maior mote dessa série: cuidado com sua saúde mental!

Um estresse pós traumático de Dani Rojas (Cristo Fernández) foi o estopim para contratarem a Dra Sharon Fieldstone (Sarah Niles). O resultado da recuperação excepcional de Dani após consultas com a Dra encorajou outros jogadores a conversarem com ela. E, desde então, o grupo todo colheu os benefícios do cuidado com a saúde mental.

Foi no segundo ataque de pânico de Ted Lasso que ele resolveu pedir ajuda à Dra. Ele foi muito relutante no início do tratamento mas, quando decidiu se abir, seus traumas e fantasmas confrontados.

Se o tratamento à saúde física já é um tabu entre homens, imaginem o da saúde mental? Esse assunto é um tabu masculino pois procurar ajuda psicológica é uma demonstração de fraqueza.

Homens precisam desassociar o cuidado à saúde mental ao machismo pra ontem! Só quando ultrapassarem essa barreira, aqueles números sobre suicídio e vícios diminuirão.

Pedir ajuda não é ser fraco e nem ser menos homem. É um sinal de autocuidado, humildade e de apreço à própria vida.


Essa série é um grande exemplo de como o machismo é crudelíssimo com os homens também. O entretenimento tem mostrado cada vez mais histórias de mulheres poderosas e do que são capazes de fazer, e isso é importante demais, mas tão importante quanto é discutirmos uma nova masculinidade, uma virilidade atóxica e compatível a sociedade que queremos.

Ted Lasso é um sucesso do streaming e ganhou seis troféus no Emmy 2021, incluindo o de melhor série de comédia. São 37 prêmios ao todo desde o início da série em 2020. As duas temporadas estão disponíveis no Apple TV+ e a terceira temporada já está confirmada para 2022.

Cast de Ted Lasso no Emmy 2021

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